Revista do CBH do Rio Pará nº1: Preservação Remunerada

24/01/2023 - 10:00

Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) torna a preservação e recuperação ambientais uma atividade rentável

Produtores rurais, principalmente aqueles que possuem cursos d’água em suas propriedades, frequentemente esbarram na seguinte dúvida: maximizar a produção ou conservar os recursos naturais? Embora esse pareça ser um impasse cuja resposta implica escolher entre o lucro e a preservação ambiental, iniciativas como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) oferecem uma alternativa através da qual o produtor rural é remunerado por cada hectare de sua terra que, por exemplo, esteja reservado para produzir água, eliminando o dilema.

 

“CONSERVAÇÃO RIO ACIMA, BENEFÍCIOS RIO ABAIXO”

Em Pará de Minas, onde o presidente do CBH, José Hermano Franco, é secretário municipal, PSA já é realidade.

Em Pará de Minas, onde o presidente do CBH, José Hermano Franco, é secretário municipal, PSA já é realidade.

A política de PSA é de adesão voluntária e pode ser aplicada para diversos tipos de serviços ambientais, mas é mais largamente utilizada para incentivar o produtor rural a produzir água. O programa “Produtor de Água” da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) surgiu de uma demanda da sociedade há cerca de 20 anos diante dos desafios de escassez hídrica.

Quem explica como tudo começou é Henrique Chaves, professor da Faculdade de Tecnologia da Universidade de Brasília e ex-assessor técnico da ANA. Ele é um dos responsáveis por implantar a política na agência e conta que o que a ANA buscava era “uma compensação financeira por melhorias ambientais realizadas por produtores rurais que protegessem cursos d’água e nascentes, uma vez que a conservação rio acima se converte em benefícios rio abaixo. Os principais beneficiados por esse tipo de incentivo são a população, tanto rural quanto urbana, o saneamento e o próprio produtor, desde que o pagamento seja proporcional ao benefício gerado e que o produtor receba a compensação apenas após a mensuração do produto.”

A ANA oferece o aporte financeiro, mas ela não é a única. Prefeituras municipais e a iniciativa privada também investem no pagamento já que, ainda segundo Henrique, o retorno, tanto ambiental quanto financeiro, é significativo. “Fizemos um estudo para o ‘Programa Água Brasil’, fruto da parceria entre o Fundo Mundial para a Natureza (WWF-Brasil), Banco do Brasil e ANA, e o resultado foi espantoso: para cada R$ 1 investido no Pagamento por Serviços Ambientais, o retorno é de R$ 2 a R$ 8, a depender do projeto e do tipo de obra. Por exemplo, obras de terraceamento retornam mais de R$ 5 por real investido”, celebra.

 

O EXEMPLO DE EXTREMA

O primeiro projeto de PSA no Brasil foi em Extrema, cidade mineira na divisa com o estado de São Paulo. Alguns dos cursos d’água que nascem em Extrema contribuem para o Sistema Cantareira, responsável por abastecer a Região Metropolitana de São Paulo. Iniciado em 2005, o programa “Conservador das Águas” é exemplo não só para o Brasil, como também para o Mundo. Foi reconhecido pelo Prêmio Internacional de Dubai de Melhores Práticas, em 2012, de iniciativa do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) e se expandiu para outras cidades brasileiras através do programa “Conservador da Mantiqueira”, em 2016.

Extrema tornou-se um centro de referência na política do PSA, e o ex-secretário de Meio Ambiente da cidade, Paulo Henrique Pereira, idealizador do programa, conta quais foram as dificuldades e os resultados. “No início tivemos muita resistência. Naquela época não tínhamos atravessado grandes crises hídricas. Ainda que a essência do PSA seja a remuneração pelos serviços ambientais prestados, há uma desconfiança por parte do produtor quanto a se o pagamento será honrado após ele fazer as modificações na sua propriedade, bem como da permanência da política para além das alternâncias de governos. Mas, passado esse primeiro período de resistência, o programa ganhou fôlego e já contamos com mais de 2 milhões de árvores plantadas e mais de 1000 hectares de áreas degradadas recuperadas. Hoje vem gente de todo o Brasil para conversar conosco e ouvir nossas experiências”, conta.

Alguns dos cursos d’água que nascem em Extrema (MG) contribuem para o Sistema Cantareira, responsável por abastecer a Região Metropolitana de São Paulo

Alguns dos cursos d’água que nascem em Extrema (MG) contribuem para o Sistema Cantareira, responsável por abastecer a Região Metropolitana de São Paulo

 

O PSA NA BACIA DO RIO PARÁ

Produtor rural Antônio Laes Barbosa é um dos beneficiados pelo PSA de Nova Serrana.

Produtor rural Antônio Laes Barbosa é um dos beneficiados pelo PSA de Nova Serrana.

Na Bacia Hidrográfica do Rio Pará já há municípios que aderiram ao PSA. Em Pará de Minas, por exemplo, o pagamento por serviços ambientais ainda é tímido, beneficiando hoje quatro produtores rurais que serão pagos pela primeira vez este ano. Mas a perspectiva, segundo o Secretário de Agronegócio, Desenvolvimento Rural e Meio Ambiente e presidente do CBH do Rio Pará, José Hermano Franco, é de que, até o fim do ano, esse número chegue a 15.

Em Nova Serrana, outros 15 produtores já recebem por serviços ambientais prestados. Érica Santos, Diretora de Agricultura da Prefeitura e Coordenadora do PSA do município, informa que o Programa Produtor Rural se apresentou como uma alternativa para o processo de urbanização acelerado que acabou descuidando dos recursos hídricos. “O projeto ainda está em andamento, mas, em conversas com os produtores beneficiados, já sentimos os resultados positivos na quantidade e qualidade da água. Foi realizado um levantamento de vazão em alguns pontos das microbacias antes do início das obras, e será realizado novamente ao final do projeto para se ter um comparativo. O projeto visa o cercamento de 65 nascentes e, até o momento, foram cercadas 19”, conta.

Um desses beneficiados é o produtor Antônio Laes Barbosa, conhecido como Laércio. Nos 27 hectares de sua propriedade em Nova Serrana está a nascente do Córrego Padilha. Foi no entorno dessa nascente que o programa se instalou, com 1400 metros de cerca e reflorestamento desde o início deste ano. E ele já tem experiência com cercamento de nascente. “Aqui na minha terra tem duas nascentes, uma cercada e outra, não. A nascente que não foi cercada possui maior vazão e, mesmo assim, secou durante um período de estiagem que tivemos na região há cerca de quatro anos. A que estava cercada, mesmo com menos água, permaneceu”, conta o apicultor e agricultor familiar.

Agora Laércio irá receber quatro parcelas anuais do programa a partir de dezembro deste ano por ter cercado a segunda nascente, e já celebra os resultados futuros baseado no que teve anteriormente. “Minha terra faz divisa com uma fazenda que tem pesca esportiva e depende da água de boa qualidade que sai daqui para os pesqueiros que frequentam lá, e o cercamento vai proporcionar isso. O benefício não será só para mim!”, concluiu.

 

COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA E PSA NO CBH DO RIO PARÁ

O presidente José Hermano Franco confirma que o CBH do Rio Pará pretende utilizar os recursos da cobrança pelo uso da água na bacia para disseminar o PSA entre outros municípios da região. Ele entende que, ainda que o Comitê possua programas de recuperação e preservação ambiental, o pagamento por serviços ambientais é um “uso nobre dos recursos de cobrança pelo uso da água”. Para Hermano, o momento agora é de debate. “Precisamos discutir em Plenária como operacionalizar o pagamento e como ampliar os parceiros, seja da iniciativa privada, seja do poder público”.

José Hermano acredita que a valorização do produtor de água é uma questão de justiça e de sustentabilidade, uma vez que quem tem uma nascente em seu território arca com os ônus da diminuição da área produtiva e da preservação do manancial. “A nossa Constituição afirma que a água é um bem comum. Agora, a produção de água tem um custo, já que quem tem em sua propriedade uma nascente precisa reduzir sua área de produção em virtude da Área de Preservação Permanente [APP] em torno do manancial. Então, é justo que o ônus da produção de água seja compensado. É uma questão de justiça e de sustentabilidade. Com o pagamento, nós estamos garantindo que aquela água seja abundante e de boa qualidade para o uso comum, além de remunerar aqueles que produzem essa água”, finaliza.


Assessoria de Comunicação CBH Rio Pará:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Leonardo Ramos
Fotos: Léo Boi

Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Pará

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