O Instituto Trata Brasil, organização da sociedade civil criada em 2007 e especializada em saneamento básico, promoveu estudo sobre perdas de água potável com análises do panorama nacional, regional e das 100 maiores cidades brasileiras.
Outra de suas iniciativas, o Painel Saneamento Brasil traz informações de 834 municípios. No caso da Bacia do Rio Pará, com oito cidades nessa lista, somente Nova Serrana (perdas de 41,3%) e Divinópolis (com 40,2%) apresentaram taxas superiores ao índice médio nacional, de 37,54%. Ambas têm os serviços operados pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). Os números são do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) e se referem a 2020.
Os outros seis municípios são Bom Despacho, Florestal e Itatiaiuçu, os três com operações a cargo da Copasa, Itaguara e ltaúna, ambos com serviços autônomos municipais, e Pará de Minas (que tem concessionária privada). A campeã de economia é Itaguara, com 16,8% de perdas, praticamente a média dos países mais ricos do planeta, que é de 15%. Pará de Minas fica em segundo lugar, com 18,3%.
José Hermano Franco, presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Pará (CBH Rio Pará), sabe que “o assunto interessa demais ao Comitê, que, como defensor das águas, quer que uso seja o mais racional possível”.
“Embora seja uma amostragem pequena da bacia, o estudo revela deficiências”, diz, e avalia que “algumas das cidades estão bem, mas a maioria não está. Números como 37%, 40% de perda é muita coisa. Para além disso, o Comitê trabalha também na análise das outorgas e, se nós temos desperdício de água, isso significa que teríamos mais potencial, por exemplo para diminuir conflitos pelo uso”.
Franco exorta os “municípios a levarem esse tema muito a sério, assim como as concessionárias”. Para ele, “a Copasa costuma falhar nisso e tem que corrigir” e, “mesmo o Comitê não tendo ação direta na questão”, não se furta a meter a mão na massa: “Devemos contribuir, conversar com os municípios para que eles cobrem das concessionárias, junto com a gente, essas melhorias”.
Município de Pará de Minas tem taxa de perdas abaixo da média nacional, ainda assim, toda atenção é importante
Buraco sem fundo
A situação é ruim no país todo. A média nacional do chamado IN013 – Índice de Perdas no Faturamento – em 2020, de 37,54%, está mais de 20 pontos percentuais acima da taxa dos países desenvolvidos, e maior até do que o valor dos países em desenvolvimento, de 35%.
Minas Gerais é o 11º estado em perdas de faturamento (38,01%) e o 10º em perdas na distribuição (37,52%). Uberlândia, na bacia do Rio Araguari, é o único município mineiro dos 100 mais populosos do país a figurar entre os 20 com menor índice de perdas.
Somente oito desses 100 municípios atendem hoje às metas da Portaria nº 490/2021, do Ministério do Desenvolvimento Regional, que estabelece uma rota descendente em perdas totais de água, partindo de 100% da média nacional no biênio 21/22; 95% em 23/24 e assim sucessivamente até o índice de 65% da média atual a partir de 2034 (perda de 24,4%).
Outra informação preocupante revela que os extravios, ao invés de sofrerem redução, vêm aumentando ao longo do tempo. Na Região Sudeste, uma das mais bem equipadas do país em serviços de saneamento, a água tratada que sumiu antes de chegar às torneiras de residências e empresas alcançava 34,73% do total distribuído em 2016 e pulou para 38,09% em 2020.
O drama é ainda maior. Segundo o estudo do Trata Brasil, a maior parte das empresas do ramo não mede as perdas de água de modo consistente nem adota mecanismos de auditoria independente para aferir a quantidade de água que lhe foge pelos canos.
Alto custo
Esse sumiço de recursos hídricos decorre de causas diversas, como vazamentos, erros de medição e consumos não autorizados nem faturados. Os impactos negativos recaem sobre o meio ambiente, a receita e os custos de produção das empresas do setor, onerando todo o sistema, cujo último elo da cadeia é o bolso dos usuários.
As perdas aparentes, ou comerciais, correspondem ao volume de água consumido, mas não autorizado ou faturado, graças a erros de medição ou leitura, ligações clandestinas, falhas de cadastro comercial e outros motivos. Seu resultado imediato é a redução da capacidade financeira dos prestadores e, ato contínuo, de recursos para ampliar a oferta, melhorar a qualidade dos serviços e caprichar na manutenção. O efeito seguinte é o repasse para a tarifa.
Já as perdas reais, devidas a vazamentos em adutoras, redes, ramais, conexões, reservatórios e outras unidades operacionais do sistema, aumentam o custo de produção e desperdiçam recursos hídricos, requerendo novos mananciais. Mais uma vez, a história acaba no (e com o) consumidor.
O estudo mostra que o volume total de água não faturada no ano de referência foi de aproximadamente 7,2 bilhões de m³, mais ou menos o equivalente a 8 mil piscinas olímpicas de água desperdiçadas todo dia. As perdas físicas dariam para abastecer cerca de 66 milhões de pessoas durante um ano, o dobro dos brasileiros sem acesso ao abastecimento de água em 2020.
Assessoria de Comunicação do CBH do Rio Pará:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Paulo Barcala
Fotos: Michelle Parron; Fernando Piancastelli