Informativo Rio Pará nº 08: Entrevista com Marcelo da Fonseca

27/10/2025 - 12:59

Diretor-geral do IGAM fala sobre o novo Programa Produtor de Água, que traz estratégias específicas para MG

O Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), em parceria com o Instituto Estadual de Floresta (IEF) e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), oficializou a criação do Programa Produtor de Água de Minas Gerais. A intenção é adequar as ações à realidade do estado, promovendo conscientização ambiental e preservação dos recursos hídricos.

O Programa Produtor de Água já é desenvolvido há alguns anos pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). Agora, a partir de um acordo de cooperação técnica, foi criada uma versão estadual da iniciativa. As ações incluem o financiamento de obras de preservação em propriedades rurais, além do pagamento por serviços ambientais, remunerando financeiramente os produtores rurais que adotarem as práticas de conservação.

Com a nova versão do programa, o IGAM quer consolidar o protagonismo de Minas Gerais nas ações de sustentabilidade. Para entender melhor o papel dos Comitês de Bacias na execução das ações, conversamos com o diretor-geral do IGAM, Marcelo da Fonseca.

 

Quais as principais mudanças trazidas pelo novo Programa Produtor de Água?

O Programa Produtor de Água teve uma experiência bem-sucedida em Minas, ganhando reconhecimento nacional e internacional. A partir dessa iniciativa, diversos projetos foram implantados no estado, concentrando quase 50% das ações apoiadas pela ANA, especialmente na região das nascentes do São Francisco e da Serra da Canastra, com foco na segurança hídrica, proteção de nascentes, conservação ambiental e pagamento por serviços ambientais. Com o apoio contínuo do Governo de Minas, foi firmada uma cooperação técnica entre IGAM, IEF e SEMAD para ampliar e adaptar o programa ao contexto estadual. Essa transição envolveu capacitações, dias de campo e a criação de uma unidade regional, a Nascentes do São Francisco, responsável por coordenar as ações na bacia do Alto São Francisco. Durante esse processo, o programa foi aprimorado, incorporando ações voltadas à produção sustentável, regularização do uso da água e orientação aos produtores rurais. Essa versão adaptada foi apelidada de “Programa Produtor de Água Pão de Queijo”, refletindo a identidade mineira e o foco no fortalecimento da agricultura local.

Qual importância das ações de conservação, regularização ambiental e incentivo ao produtor rural desenvolvidas pelo Programa?

Ao colocarmos o produtor rural como protagonista do processo, conseguimos envolvê-lo diretamente na adequação ambiental da propriedade, reconhecendo o serviço essencial que ele presta para toda a bacia hidrográfica. É na propriedade rural que se protegem as nascentes, as Áreas de Preservação Permanente (APPs) e, consequentemente, se garante os corpos hídricos que abastecem a região. Por meio desses programas, voltados à produção de água e à conservação ambiental, é possível, a partir da lógica das microbacias, promover intervenções que assegurem água em quantidade e qualidade, sem gerar degradação. O engajamento dos atores locais é fundamental, envolvendo não só os produtores, mas também toda a comunidade: sindicatos, prefeituras, empresas, associações e demais parceiros. Esse esforço coletivo é ainda mais relevante em regiões com deficiência hídrica significativa, onde ações como essas são essenciais para garantir a segurança hídrica e a sustentabilidade do território.

Por termos o pagamento pelos serviços ambientais executados, obviamente existe uma questão financeira envolvida, mas acredito que o principal é o fato do programa reconhecer o papel do produtor rural na segurança hídrica. Quando a gente olha para bacias, como a do Pará, já temos em alguns locais uma deficiência hídrica considerável. Então, trabalhar com o produtor para que ele possa contribuir ativamente para a preservação dos recursos hídricos é muito gratificante pra ele, que se sente valorizado. Este é o ponto chave do processo: o reconhecimento e o empoderamento do produtor rural como protagonista do processo.

Quais são algumas das práticas incentivadas pelo programa para conservar água e solo?

O programa é estruturado em diversas fases, começando com um diagnóstico detalhado da bacia hidrográfica contemplada. Nessa etapa, são identificadas as principais dificuldades ambientais e produtivas da região, bem como suas potencialidades. A partir desse levantamento, passa-se à elaboração de projetos técnicos individualizados para cada propriedade rural. Esses projetos consideram as características específicas de cada área e apontam as intervenções necessárias para promover a conservação ambiental e a produção de água em quantidade e qualidade. As ações recomendadas podem incluir, por exemplo, cercamento de nascentes, recuperação de APPs com plantio de mudas nativas, implantação de sistemas de tratamento de esgoto doméstico, construção de barraginhas para retenção de água da chuva, além de outras soluções sustentáveis adaptadas à realidade local. É importante destacar que nada é imposto. As propostas são apresentadas de forma transparente e o produtor rural tem autonomia para decidir sobre a adesão às ações recomendadas. O foco é construir, junto com o produtor, soluções eficazes e viáveis, respeitando seu contexto produtivo e promovendo a conservação dos recursos naturais de forma participativa e integrada.

De que forma a adaptação do programa à realidade mineira pode contribuir para a sua efetividade?

Com essa abordagem, conseguimos oferecer um serviço mais completo e efetivo ao produtor rural. Atualmente, ele já possui a obrigação legal de adequar sua propriedade às exigências do Código Florestal, o que inclui, entre outras ações, a recuperação de APPs, Reserva Legal e a regularização do uso dos recursos hídricos. No entanto, ao incorporar o produtor como parceiro e oferecer apoio técnico e institucional por meio do programa, criamos um ambiente mais favorável para que ele cumpra essas exigências. Ao invés de ser apenas uma obrigação legal, a adequação ambiental passa a ser vista como uma oportunidade de melhorar a produtividade, acessar incentivos, evitar sanções e, principalmente, contribuir com a conservação dos recursos naturais da região. Esse apoio técnico personalizado aumenta significativamente a sensibilização e o interesse dos produtores em aderir voluntariamente ao programa. Ao entenderem os benefícios práticos e econômicos da regularização ambiental, os produtores tendem a se engajar com mais facilidade, o que fortalece a efetividade do programa como um todo e amplia seus resultados para toda a bacia hidrográfica.

Que desafios podem surgir na implementação de ações integradas entre SEMAD, IEF e IGAM?

Um dos maiores desafios do programa é a mobilização e articulação dos parceiros envolvidos. Trata-se de uma iniciativa que não é financiada exclusivamente com recursos do poder público. Pelo contrário, sua viabilidade e continuidade dependem da integração de diversas fontes de apoio, como os recursos provenientes da cobrança pelo uso dos recursos hídricos, parcerias institucionais, apoio de prefeituras, organizações da sociedade civil, setor privado e outros atores locais. Coordenar essa rede de parceiros exige um esforço constante de alinhamento de interesses, definição de responsabilidades e construção de compromissos comuns. É fundamental garantir que todos os atores com potencial de contribuição estejam engajados de forma efetiva no programa. Além disso, é igualmente desafiador assegurar a sensibilização e o engajamento do produtor rural, que é peça-chave na execução das ações em campo.

Qual o papel dos Comitês de Bacia para viabilizar e otimizar as ações do programa?

Os Comitês de Bacia desempenham um papel estratégico e essencial em todo esse processo. Em primeiro lugar, porque são responsáveis pela gestão participativa dos recursos hídricos no território, reunindo os principais atores locais, incluindo poder público, sociedade civil e usuários da água, em um espaço legítimo de diálogo e tomada de decisão. É dentro do Comitê que ocorre o convencimento e o engajamento das lideranças regionais, o que é fundamental para a adesão e fortalecimento do programa nos territórios. O apoio institucional do Comitê, aliado à sua atuação ativa na mobilização de parceiros, na captação de recursos e no direcionamento de investimentos, é decisivo para viabilizar as diferentes etapas do programa. Além disso, os recursos provenientes da Cobrança pelo uso da água, quando aplicados de forma estratégica por meio dos Comitês, funcionam como um catalisador, impulsionando ações estruturantes, fortalecendo a governança local e ampliando o alcance e a sustentabilidade das iniciativas voltadas à produção de água e conservação ambiental.

Qual a expectativa do IGAM quanto à execução das ações do Programa na Bacia do Rio Pará?

Nosso papel está fortemente voltado à organização e articulação do processo de captação de recursos para viabilizar as ações em campo. No caso da bacia do Rio Pará, já identificamos algumas localidades que apresentaram propostas concretas de adesão ao programa e estamos atualmente trabalhando na busca de mecanismos para sua implementação. Os programas incentivados e apoiados pelo Comitê têm sido fundamentais nesse contexto, pois permitem que essas iniciativas locais sejam integradas ao nosso projeto estruturante. Com isso, conseguimos alinhar esforços e concentrar a captação de recursos em propostas consistentes e articuladas, aumentando as chances de viabilização e ampliação das ações no território.


Assessoria de Comunicação do CBH do Rio Pará:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
 
 

Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Pará

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